quarta-feira, 29 de outubro de 2008

A respeito de cadáveres

A passividade política é uma das grandes conquistas da civilização. Depois de séculos, o homem chega ao auge do conforto e da praticidade na política, com a conquista do voto universal, que o isenta de ter que ir a audiências, comitês e foros, deixando essas tarefas a cargo de uma classe cinzenta e deselegante, a dos políticos. Liberado das obrigações públicas, o camarada passa então a despender seu tempo em coisas realmente importantes: produzir, ganhar dinheiro, observar o ciclo de reprodução de canários, Sex and the City, Seinfield, descobrir a cura da diabetes, e por aí vai. Uma sociedade próspera é, sem dúvida, uma sociedade politicamente passiva. Mas, obviamente, não se pode esperar pela docilidade de uma população que vive, por exemplo, sob um regime tirânico e corrupto, como a França pré-revolucionária. Trocando em miúdos, a tal da passividade política só é possível e desejável numa democracia representativa, este modelito que demoramos tanto para construir, e que volta e meia é posto em xeque por meia-dúzia de sabichões que juram ter descoberto um sistema melhor. É como se, criado o controle remoto, que nos faz passivos, obesos e felizes, um chato surgisse prometendo inovar com uma rebimboca que nunca funciona. Mas os chatos que desejo abordar agora são os que, em vez de trazer uma rebimboca, sugerem que tudo volte a ser como em 1950, em preto-e-branco e sem controle remoto. São os “ativistas”, que se esquecem que numa democracia moderna, existem instituições, cujos agentes recebem muitas vezes um rechonchudo vencimento, para que façam aquilo que não podemos fazer por falta de tempo e paciência. Esse pessoal do ativismo prefere ir às ruas por conta própria, do que fortalecer as instituições da democracia, indo de encontro à mesma; acham que resolver as coisas no grito é “democracia”. Primos dos ativistas são os “voluntários”. Os do Obama, por exemplo, são saudados como apóstolos, como novos cruzados pela imprensa mundial. Os do Gabeira, como heróis, mártires, argonautas da zona sul. Fala-se muito do renascimento da política, que poderia muito bem continuar deitadinha em sua cova fria, cinzenta e deselegante.

-Dan-

2 comentários:

Joao Vicente disse...

educacao e ideologia na politica sao pilares em qualquer pais desenvolvido. aqui, ainda temos, na politica, aquela relacao assistencialista, "ser honesto eh careta" e coisa e tal... temos q renascer de alguma forma, senao morreremos em vao.

Analice Ról disse...

Olá rapazes. Achei o blog de vocês por acaso e gostei muito. Vocês escrevem muito bem e têm um espírito crítico avançado e inteligente. Parabéns! Um beijo
Meu blog: outromar.blogspot.com