sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Falastrões x Reservados

-Dan-

Era um psicoanalista, ou neurolinguista, ou mesmo um clínico geral, quem sabe, o que importa é que tinha o olhar mais bem-intencionado que já olhei, por trás dos óculos grenás, que lhe conferiam um certo ar informal e bonachão. Tinha, claro, bigode – grisalho- e uma simpática calva. Seria fácil imagina-lo meu bom escudeiro, ou vassalo, ou servo da gleba, em uma outra vida, na qual fosse eu seu cavaleiro, ou suserano ou senhor. Poderia ter sido também meu Alfred, fosse eu aquele Batman gordinho do seriado de TV. Mas era só um especialista em um programa de banalidades, que dava conselhos baseados em alguma homeopatia da alma, algum novo e surpreendente ramo da psicologia moderna. Ele dizia algo como: “Diante de um problema, fale!”. “Ponha para fora seus demônios”. Algo como “Se liberta, bem!”. Quem diria que por trás das boas intenções, dos óculos grenás, do bigode e até da mancha na testa que eu havia omitido, havia um terrorista. Sim, um terrorista, porque veja bem, incentivar as pessoas a exporem seus problemas e falarem deles para o taxista, para o padeiro, para os amigos e até para mim, se eu marcar bobeira, é uma forma de, atropelando as boas regras sociais que garantem uma convivência tranqüila entre as pessoas, disseminar o caos. É como estimular o espirro em um surto de gripe. Os profissionais da auto-ajuda têm o poder de criar uma legião de chatos e falastrões que pode vir a incitar em alguém um desejo adormecido de perseguir os chatos e falastrões, criando assim um racha na sociedade: de um lado, os quietos, tentando ler livros de filosofia sentados em pufes e do outro, os falastrões gritando, falando e chorando ao pé dos pufes, até o momento em que o quieto do pufe agride o falastrão e vice-versa e está instalada a guerra civil. Uma eventual vitória dos falastrões nesta guerra acabaria com os mistérios da vida, com a poesia, e até com o discreto charme da burguesia. Os casais discutiriam a relação na noite de núpcias, os porteiros dos prédios chorariam em nossos ombros à noite e o Dr. Lair Ribeiro seria eleito presidente.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

De como ir ao analista


ante-sala de psicanalista por si só ja é um ambiente propicio a conversa, pior se for silenciosa. quando muito, ouve-se dialogos insolitos como o que precedeu uma consulta, de que me arrependo ate hoje.

nesses lugares tem de tudo, mas principalmente jornalistas de grandes jornais e escritores de literatura fantastica, cujos esforços fazem com que o perecimento mental tenda a acelerar como banana no verao. estas figuras povoam as ante-salas, distribuindo a grosso modo seus comentarios irreverentes e petulantes.

a consulta foi de amargar mas a espera valeu o constrangimento. deu-se assim, um camarada chega pro outro, ambos na galhofa:

- dizem que a crise mundial ta precisnado de terapia

- é, acho que ela precisa se filiar ao greenpeace pra vê se acha um novo sentido na vida

- o sistema morreu né

- ah mas nos meros mortais nao! estamos vivinhos

- ainda bem que nao precisamos de nenhum sistema, ja basta nossas crises internas.

- voce esta falando das crises do senado e a do supremo?

- nao, falo interno no sentido de alma mesmo, nao que tenhamos que vender a alma pelo dinheiro, to falando de terapia

- terapia da alma?

- é, rapaz, acho que meditacao ta dando certo la no oriente

- sera que é isso que falta pra acabar com a crise?

- so pode ser...

- dizem por aí que essa crise é a maior balela, tem gente que ta ficando rico com essas balelas

- pelo menos ela serviu pra eleger o obama

- nao disse?!

(..)

- e a crise de 29?

- ih, essa aí foi a maior trapaca da historia do homem

- foi tudo mentira é?

- foi, e ainda atrasou a vida de todo mundo

- é mesmo...

- olha, que eu saiba, em toda a historia, só o estreito de bering pra atrasar tanto a humanidade como atrasou a crise de 29

- que gente esquizofrenica!

- fala baixo...

por Joao Vicente