terça-feira, 10 de junho de 2008

O Assalto


Uma fulgurosa região da cidade nos aquece com seus amores modernos e contos de pura adrenalina e diversão. Em ocasião no bairro da Lapa, trazer pessoas que chegam pela primeira vez ao Rio é a melhor maneira de mostrar todas as nuances desta que, à primeira vista, parece grande, mas ainda resguarda o espírito faroeste e os pistoleiros das cidades do interior.
Um desses tirou o revólver do bolso e o pôs na frente do rosto do servente, no Bar da Sorte, cerceando a área do curvelo dos Democráticos. Ficou esperando ele tomar uma iniciativa logo antes que resolvesse apertar o gatilho. O homem de imediato foi lá pegar tudo que tinha e nem pensou duas vezes em tirar os dois broches de ouro que usava na camisa. Ficamos boquiabertos com a insolência do assaltante: saiu do meio do pessoal em pé aglomerado perto do balcão açoitando o coitado do funcionário enquanto a rapaziada fugia. Restava-nos a agrura de sair correndo também; mas ainda tínhamos que chamar o seu Luiz que, nesta altura dos acontecimentos, encontrava-se no banheiro.
Foi quando nos demos conta situação: em companhia da dona e seu ajudante com a arma empunhada em seu rosto, o sujeito clamou e bradou rispidamente sem dar nenhuma brecha a reação do assaltado, foi logo abrindo o caixa de dinheiro; o comparça aproveitou para pegar uma garrafa de cachaça perdida em uma das mesas; o servente lá sentado, esperando o término do engodo, não queria complicar ainda mais o seu câncer que estava às beiras de se manifestar novamente, até o pulmão direito não tinha mais.
- O seu Luiz é que vai ter uma síncope se sair e der de cara com este marginal! Procuremos um meio de avisá-lo então sobre o que está se passando, assim ele fica por lá mesmo e nos poupa o transtorno do salvamento.
Era o que me faltava para aguar de vez a relação com o futuro sogro. Não bastasse ele ter vindo de uma infância pacata de cidade pequena, sem grandes estresses; morava pelos lados de Varre-Sai, sua terra natal, bem próximo à Presidente Dutra – figura folclórica do lugar, tinha um armazém nas cercanias do distrito policial, vivia de casa pro trabalho sem muitas aporrinhações –, agora como vou explicar o acontecimento? Será que vai entender os atrasos da cidade grande?
- Já sei! Vamos ligar para o celular e pedir que fique lá dentro pois - aí dissemos - o bar está em obras, reformando a pintura, não vamos permitir que respire este cheiro horrível de tinta forte, poderia fazer mal a sua sinosite. Mal sabíamos que havia anos seu Luis se recuperara da doença, tinha a pele conservadíssima, um fôlego juvenil e soltava pipa como criança. Alguns dias não voltava para casa até o sol cair; a esposa destemperada não se conformava com a soltura do marido, ia lá pelas mediações da autovia catar o peralta "avoado".
Naquele momento ele viu que a vida tinha sentido: olhou-se no espelho com um certo apego pela sua juventude interiorana – amistosa nas noites embaladas do clube Palmeiras –, saiu dali um sopro de anima profunda. Abriu a porta do banheiro que dá para o bar e inspirou ar de forma a abraçar todos os prazeres da vida.
- Eu estou muito bem, meu filho. Não tenho muito o que reclamar, afinal eu estou no Rio de Janeiro, com todas essas moças bonitas que estão aí fora! Agora me diga, com o que mais posso me preocupar, não eh? Não era bem isso o que queria dizer pois, de um jovem livre nos campos da baixada, foi ao cárcere de um mero trombadinha na Lapa:
- Olha, meu companheiro, dá pra liberar o velho aí? Só estamos de passagem, não me agrada muito este bar!
O amiguinho do homicida, alguns graus bem acima, me irritava com a soberba em arrotar na frente de todos.
- Já cedi a cerveja ao teu colega, não dá pra reaver o parente?
Em seus últimos planos para ver algum sentido na vida novamente, seu Luiz implorava por um fim digno com uma conta mais gorda no banco, uma mulher jeitosinha como nos tempos do Palmeiras e ver a filha casar com outro cidadão que não comigo; quem sabe com um daqueles fazendeiros de Varre-Sai?
Saí sem que ninguém percebesse e fui ao passo do meliante que estava nas últimas de conseguir uma bem sucedida operação. Também porque precisava mostrar ao sogrão, de algum modo, meu ímpeto pela sua salvação, ou pela união da família:
- Eu queria pagar ao senhor o que lhe devo, aceita a carteira? A carteira em troca do refém? Pedi encarecidamente para que desse alforria ao seu Luiz já frustrado pela noite em pasmo: - Não tem polícia nesta cidade não!?
Subiu à cabeça do menino uma saída então mais cinematográfica:
- Eu nao vou liberar ninguém não. Vão ficar todos presos no banheiro! Ô Já é("Já é" era o nome do ajudante do criminoso), amarra esses otários aqui e coloca lá dentro, anda! Pelas tantas, o rapaz conseguiu juntar mil reais e meteu o pé para os lados da favela dos Prazeres. Só que tinha esquecido de um detalhe apenas: trancou o comparca junto com a gente dentro do banheiro!

Joao Vicente

2 comentários:

Anônimo disse...

Acho q o seu Luiz poderia tentar desarmar o bandido que ficou no banheiro causando um disparo acidental que atingiria seu dedão do pé. Aí, ele ficaria com remorso e permitiria o namoro entre sua filha e vc.

Anônimo disse...

eu voto por uma grande orgia dentro do banheiro!